Nos últimos anos, a busca por um ambiente limpo e higienizado se intensificou, especialmente após a pandemia de Covid-19. O uso de produtos de limpeza cresceu consideravelmente, refletindo nossa preocupação com patógenos invisíveis. No entanto, essa obsessão pela desinfecção pode estar nos expondo a um outro tipo de perigo: os efeitos adversos de agentes químicos presentes nesses produtos.
A história da limpeza doméstica remonta a milênios. Civilizações antigas desenvolveram métodos curiosos para remover impurezas, como os romanos, que utilizavam urina para lavar tecidos devido ao seu teor de amônia. Felizmente, a tecnologia evoluiu, proporcionando fórmulas mais eficazes e convenientes. Mas será que esses avanços vieram sem consequências?
O impacto dos produtos de limpeza na saúde
Diversos estudos recentes sugerem que produtos de limpeza convencionais podem afetar nossa saúde respiratória. Uma análise publicada em 2024 revisou 77 estudos sobre o tema e concluiu que a exposição regular a esses produtos pode agravar doenças respiratórias, sendo um fator de risco para o desenvolvimento da asma.
Os sprays de limpeza, em particular, representam uma ameaça maior do que lenços umedecidos ou líquidos. Quando pulverizados, liberam partículas químicas no ar, tornando mais fácil a inalação de substâncias potencialmente nocivas. O uso frequente — entre quatro e sete vezes por semana — foi associado ao aumento da incidência de asma em adultos jovens, além de agravar sintomas em pessoas já diagnosticadas com a condição.
Além disso, há evidências de que a exposição a produtos de limpeza durante a gestação pode afetar o sistema respiratório da criança, aumentando as chances de chiado persistente nos primeiros anos de vida. Crianças respiram mais rapidamente do que adultos, o que amplifica sua vulnerabilidade a compostos voláteis.
Quais substâncias devemos evitar?
Muitos produtos de limpeza contêm compostos químicos conhecidos por seus efeitos irritantes. Entre os principais vilões estão:
• Cloro e derivados: encontrado em desinfetantes e alvejantes, pode irritar olhos, pele e pulmões.
• Amônia: presente em limpadores de vidro e multiuso, pode desencadear problemas respiratórios.
• Ácido clorídrico e cloramina: usados na limpeza pesada, podem causar reações químicas perigosas quando misturados com outras substâncias.
• Hidróxido de sódio: altamente corrosivo, está presente em desentupidores e limpadores de forno.
Ao serem inalados, esses compostos podem causar inflamação nas vias aéreas e danos celulares.
Produtos de limpeza “verdes” são mais seguros?
Nos últimos anos, houve um aumento na popularidade dos produtos de limpeza “naturais”, que prometem fórmulas menos agressivas à saúde e ao meio ambiente. Uma revisão de estudos indicou que esses produtos tendem a ser menos prejudiciais do que os convencionais, mas ainda há poucas pesquisas sobre seus impactos a longo prazo.
A cientista Emilie Pacheco Da Silva investigou o uso de produtos “verdes” e caseiros em uma amostra de mais de 40.000 pessoas. Seus achados sugerem que esses produtos podem ser menos prejudiciais para pessoas com asma, mas ainda não há um consenso definitivo.
Outro problema é a falta de uma regulamentação clara para o termo “verde”. Muitas marcas utilizam essa nomenclatura como estratégia de marketing, sem necessariamente garantir uma composição mais segura. Produtos com fragrâncias naturais, por exemplo, podem conter compostos como o limoneno, que, ao reagir com o ar, forma formaldeído, um conhecido cancerígeno.
O risco da resistência antibiótica
O uso excessivo de produtos de limpeza antibacterianos também levanta outra preocupação: a resistência aos antibióticos. Esse fenômeno ocorre quando bactérias desenvolvem resistência aos medicamentos, tornando infecções mais difíceis de tratar.
A epidemiologista Elaine Larson, da Universidade de Columbia, conduziu um estudo para avaliar a eficácia de produtos antibacterianos na prevenção de doenças respiratórias. Ela distribuiu produtos de limpeza para famílias e monitorou seus sintomas ao longo de um ano. O resultado? Não houve diferença significativa entre aqueles que usaram produtos antibacterianos e os que utilizaram versões comuns. Isso reforça a ideia de que a fricção mecânica da limpeza pode ser tão eficaz quanto os agentes químicos.
Além disso, o uso indiscriminado de desinfetantes pode afetar o equilíbrio da microbiota domiciliar. Assim como no nosso intestino, existe um ecossistema microbiano em nossas casas, e eliminá-lo indiscriminadamente pode trazer consequências inesperadas.
Como minimizar riscos ao limpar a casa?
A ciência ainda está desvendando os impactos dos produtos de limpeza na saúde, mas algumas recomendações já podem ser seguidas para reduzir a exposição a substâncias nocivas:
1. Priorize ventilação: manter janelas abertas ao usar produtos de limpeza reduz a concentração de compostos voláteis no ar.
2. Prefira líquidos a sprays: produtos líquidos minimizam a dispersão de partículas no ambiente.
3. Evite fragrâncias artificiais: fragrâncias adicionadas podem conter substâncias irritantes.
4. Use alternativas caseiras com cautela: ingredientes como vinagre e bicarbonato de sódio podem ser eficazes, mas sem uma padronização clara, o uso excessivo pode ser prejudicial.
5. Reduza o uso de produtos antibacterianos: para a maioria das superfícies, sabão comum e água são suficientes.
A limpeza é essencial para manter um ambiente saudável, mas o equilíbrio é fundamental. Em vez de tentar eliminar todos os micróbios de nossas casas, talvez devêssemos nos preocupar mais com a qualidade do ar que respiramos.